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De
entre todos os Deuses foi Lúcifer aquele a manter a relação mais
notável com a Humanidade. Por isso, pretender o satanismo na
Bruxaria é oximoro. “Satã”, palavra de origem hebraica (Satan)
significa “o oposto” “o adversário” “o que discorda de
nós” é elemento puramente Cristão, considerado como símbolo do
mundo material. A palavra hebraica “Satanás”[1] do latim é
corruptela sânscrita “Sanatanas”, significa eterno e até hoje
na tradição hindu, ainda é aplicada às três pessoas da Trimurti
(Brama,
Shiva
e Vishnu)
e às três divindades femininas correspondentes. Ideia surge no
século XII e sobretudo com a difamação lançada pela Igreja para
justificar a perseguição às bruxas. Compreenda-se, os legítimos
Bruxos e Bruxas nunca adoraram Satanás, o qual é uma invenção da
teologia católica, não se importava qual a divindade adorada, para
a igreja seria sempre Satanás. Há um axioma em Antropologia, o Deus
da tribo conquistada, torna-se sempre no “Diabo” da tribo
vencedora. O Satanismo, como tal, é criado no ano de 1966 por Anton
La Vey (provavelmente) se baseou em vários sistemas mágicos e
religiosos entre os quais, se calhar na Wicca, mas somente isso.
Existem
dois discursos: aquele presente nas narrativas oficiais dos processos
inquisitoriais,
tratando a Bruxaria como meras representações teatrais monstruosas
e de nível imaginário e requintada malvadez, como considerarem os
Sabates uma inversão da
missa
com a presidência do Diabo; e o discurso subjacente, muito
claro
através das confissões dos acusados, esclarecendo esse
Diabo
referido pelos dominicanos e jesuítas são de uma escala, energia e
valor
imputado diferente daquele. Como se sabe os
aquelarres[2]
e
coventículos hispânicos, não era Satã mas o bode negro.
A
corrente Laveyiana passou a ser o construtor cultural da Igreja
moribunda, sendo literalista quanto aos aspectos e factos históricos,
ingenuamente ou por conveniência, do seu satanismo de base, aparece
como
verídico.
Portanto, a introdução de Satã na Bruxaria Tradicional é muito
recente na história da Bruxaria neopagã resultante de um melhor
conhecimento
da sabedoria gnóstica.
Em
muitos casos, a figura satânica – o bode – seria incorporado
voluntariamente nas assembleias satânicas para desagregar a Bruxaria
dos cultos pagãos onde se conservavam puros e conformes aos seus
cânones primigénios e anteriores ao cristianismo. A figura do bode
não se encontrava presente em nenhuma das religiões; não se
praticavam assembleias sabáticas ou aquelarres e apenas existiam os
ritos vudus celebrados sob as segas pelos escravos negros
(Barrachina, 2006).
Segundo
Carlo Ginzburg, as coisas nem sempre se passaram assim. Nalguns
casos, a diferença entre as perguntas dos juízes e as respostas dos
acusados deixava entrever elementos ligados a cultura profunda.
Partindo daí, Ginzburg procurou recompor as peças dispersas da
história nocturna, abordando movimentos contra os leprosos, judeus,
heréticos e feiticeiros. Isso levou-o a investigar a antiga cultura
de fundo xamânico e a desembocar na identificação de formas da
experiência de morte e do além com as estruturas narrativas.
«O
diabo não passa de fantasma e símbolo do mal. O Judaísmo primitivo
ignorou-o; por outro lado, o Jehovah
tiránico e sanguinário dos judeus não tinham necessidade deste
espantalho. A lenda da queda dos anjos encontra-se no “Livro de
Enoque”, desde há muito reconhecido como apócrifo e escrito
tardiamente. Durante o grande cativeiro na Babilónia, o judaísmo
recebeu das religiões orientais o conceito das divindades pérfidas,
mas esta ideia permaneceu popular, sem penetrar nos dogmas. E Lúcifer
continua ainda a ser Estrela da manhã e Satã o anjo, filho de Deus.
Não
se poder “negar o facto certas mulheres celeradas transformadas em
sequazes de Satã (1 Tim. 5.15)”, seduzidas pelas fantásticas
ilusões dos demónios, afirmam cavalgar de noite certos animais
junto com Diana, Deusa dos pagãos e com grande quantidade de
mulheres; percorrer grandes distâncias no silêncio da noite
profunda; obedecer às prdens da Deusa como se esta fosse Sua
Senhora; e serem chamadas a servi-la em determinadas noites
(Ginzburg,
1989).
Mais
tarde, se Cristo fala do Malvado e do demónio, é para acomodar às
ideias populares do seu tempo; mas, para ele, o diabo não existia...
No Cristianismo, o Jehovah
(Iavé) vingativo dos judeus converte-se no Pai bondoso: desde então,
as demais divindades são divindades do mal. No seu crescimento, o
cristianismo entrou em contacto com o helenismo e recebeu dele a
concepção de Plutão e das Fúrias, e sobretudo do Tártaro,
acomodando-as a suas próprias ideias, assimilando confusamente todas
as divindades do paganismo greco-romano e das diversas religiões com
as quais se encontrou. Mas é na Idade Média quando nasceu
verdadeiramente o diabo (René
Guénon).
O
satanismo é por si só aberração tão grande quanto toda a
estrutura montada no seio do cristianismo durante 2.000 anos. Assim o
satanismo torna-se erro de outro e a existência deste favorece a
igreja católica e satélites porque torna-se a imagem “viva” de
Satã na terra continuando a servir como objecto de terror
psicológico, usando e abusando dos personagens, frustrados em
relação à sociedade, família, geralmente de fraca personalidade
ou sofredores de doenças mentais. Jung opina sobre «o enganador é
a sombra coletiva, epítome de todas as impressões inferiores do
carácter dos indivíduos». No entanto, este ponto de vista oferece
desde nosso posterior estilo de pensamento «atado». Na esfera
paleolítica, procede esta figura, arquétipo do herói. O dador de
todos os grandes favores, o portador do fogo e o mestre da
humanidade.
As
tribos caçadoras de norte-americanas atribuem o mesmo facto xamânico
da criação do mundo ao seu herói enganador paleolítico. No
momento do grande dilúvio encontramos esta figura ambígua, boiando
sobre a balsa cheia de animais, pedindo-lhes para mergulhar e subir à
pouca terra. Três fazeram-no mas voltaram exaustos; então, o
nadador extraordinariamente resistente desce – o mergulhão, a rata
almiscarada ou tartaruga – e passou muito tempo (nalguns contos
inclusive dias) volta à superfície com o ventre para acima,
praticamente morta, mas com o pedacinho da sua pata. E então, Velho,
Coiote, Corvo ou Grande Lebre – qualquer seja o personagem a
representar ao enganador – pega -o pedacinho de barro e recita o
encantamento colocando sobre a superfície da água. A partícula
aumenta e em quatro dias cresce até atingir o tamanho da terra. Os
animais vão à terra e tudo começa de novo[3].
O
monoteísmo hebraico era reticente à ideia de divisão de poderes,
Iavé era responsável pelo bem e pelo mal. Pelos sucessivos exílios
e cativeiros sucessivos, os hebreus tomaram contacto com as religiões
dos grandes impérios do Oriente estabeleceram a
distinção nítida entre as forças positivas e negativas. Assim
como desastres se abatiam regularmente sobre eles e Iavé, seu deus
protector, não podia estar obrigado a ser responsável, concluiram a
presença de maus espíritos. Se Iavé era então incapaz de gerar
entidades maléficas, se o “demónio” existia, só podia ser anjo
servidor rebelando-se contra a autoridade divina. É no segundo
“Livro de Samuel” datado do século X ANE, o espírito de Iavé
incita a desmembrar o seu povo e em seguida pune-os enviando a peste.
Cinco séculos depois, as “Crónicas” (I-21) modificaram a antiga
versão mostrando Satã o culpado e não Iavé investindo contra
Israel[4]. Não era o anjo do mal completamente culpado mas agia de
acordo com Iavé. Desta forma desviava-se da verdade Iavé = Satã
para o substituir por outro, Satã era diferente de Iavé. Existe
algum pacto, aliança tácita para não dizer similitude inquietante.
Depois do cativeiro os hebreus tornam Satã a antítese de Iavé.
Quanto
a Iavé, mesmo os luciferianos (pagãos) não o reconhecem como sendo
o criador do mundo, pois nunca poderiam cultuar a sua intrasigência,
tirania, imperfeição e ciúme, pois o direito de criação não lhe
dá o direito da opressão. O episódio do Jardim do Éden é
considerado pelos luciferianistas como ponto de partida da série de
punições sobre a nossa espécie que a própria Bíblia reconhece.
Iavé queria Adão e Eva, continuassem estúpidos. A Serpente
libertou-os e franqueou ao jugo divino. A pedra colocada sobre o
conhecimento reservado exclusivamente para a elite celeste. Então a
nossa espécie evolui só por “desobediência” à ordem
estabelecida. Refutam a Iavé o direito de adicionar à sua laia
comandos e interdições. Negam-lhe também o direito de castigar os
culpados. Portanto recusam a Iavé toda a autoridade sobre a
existência sendo assim, não o vêem como bom espírito. Consideram
Lúcifer a entidade máxima pois este ajudou a raça humana
libertar-se é a Luz para a lbertação sendo a centelha divina em
cada ser. Representa o Aéon Salvador acordando o espírito da
humanidade, prisioneira da matéria. A igreja combate também a Gnose
pela associação de Lúcifer a Cristo. Lúcifer é o nome da
libertação o Deus verdadeiro, por algumas tradições é o
Inominado. Na ibéria e nalgumas regiões da Europa continua a
chamar-se Lúcifer o «Portador da Luz».
[1]
Também pode
ter sido uma corruptela de manobra que a Igreja adoptou do
bogomilismo em que consideravam Satanel
irmão de Cristo. Bogomilismo,
criado em Bogomil (Bulgária) em 930 e significa «o amado de Deus»
esta doutrina vai eclodir e influenciar o movimento Cátaro. O
bogomilismo adopta certos elementos da tradição protestante local,
torna-a mais embaraçosa a falta de unidade doutrinária.
[3]
Encontramos
equivalentes nos mitos e lendas de todas as partes do mundo, em
qualquer lugar onde o xamanismo deixou marca: Oceania e África, bem
como na Sibéria e Europa. Na Polinésia, Maui é o enganador. O
Coelho Br’er nos mostrou pouco da sua forma africana, onde também
é Anansi, a Serpente. Entre os gregos era Hermes (Mercúrio)
mudando de forma e o mestre do caminho à terra dos mortos, bem como
Prometeo, o “ladrão” do fogo e o entrega à humanidade. No mito
germânico aparece como o feitor Loki, cujo carácter era o fogo e
quem, na época de Ragnarbic, o Crepúsculo dos Deuses, será o
dirigente das hostes de Hel.